domingo, 10 de agosto de 2014

Planeta dos Macacos: os animais!

Malcolm e Cesar
     Várias apreciações do filme “Planeta dos Macacos: o Confronto” apontam que o filme aborda várias questões, desde o preconceito até considerações políticas. Penso que o principal tema do filme é de cunho ecológico em associação ao preconceito.
     Existem dois ou três momentos no filme em que Dreyfus, o líder dos humanos, justifica a matança dos macacos como forma de privilegiar a sobrevivência da raça humana. Mais de uma vez ele afirma: “Eles são animais!”. Sim, mas este um argumento suficiente? O desenrolar do filme demonstra que não. O preconceito aí já está bem explícito, não necessitando de maiores comentários. No entanto, o que dizer do preconceito que valoriza os animais porque estes falam? No filme, o espanto maior, inclusive de toda a população de humanos, é com relação à capacidade de articular palavras. Isso não seria mais admirável do que um papagaio fazê-lo, se os macacos também não raciocinassem, contextualizassem sua fala e demonstrassem, além de tudo, consciência de si. Um animal consciente  continua sendo um animal? Ora, o homem é um “animal racional”, e como tal se isola de todos os outros, rotulados como irracionais. Estranho, porém, é a expressão atribuída aos homens, que destaca, excepcionalmente, a razão. Por que não chamá-lo de “animal consciente”? Afinal, ele é o único que possui um intelecto plenamente desenvolvido: ele pensa. E é esse pensar que torna possível ao homem, segundo Descartes, tomar conhecimento de sua existência. O intelecto, permite definir e conceituar objetos e pessoas, tornando possível definir-se, agregando muito mais consciência, ou autoconsciência. Já no sentimento, por exemplo, talvez o homem não se diferencie muito mais de certas espécies de animais...
Dreyfus
     Marcante também é o momento em que o macaco Koba lembra a Cesar o que este alegou quando brigaram anteriormente: “macaco não mata macaco”, com o fito de perdoá-lo. O líder dos macacos então afirma que Koba não é macaco, e solta-o para a morte. Cesar se refere à crueldade do ex-amigo, que o trai e comete vários crimes contra os companheiros, e não é mais digno de ser considerado um “macaco”, no sentido de não ser um símio íntegro. Os homens também costumam usar a mesma expressão para com os semelhantes genocidas, por exemplo. Na verdade, quando se usa expressões como “fulano é um monstro” ou “ele não é um ser humano” se está querendo dizer que a pessoa em questão entra em choque com os outros seres. É como se ela se opusesse à existência e à expressão de outros sujeitos. Logo, é lógico que estes queiram excluir a pessoa em foco da categoria que designa todos os seres abarcados. Assim, o psicopata cruel, que objetiva apenas o poder em detrimento da existência e da liberdade dos outros, seria um ser à parte, e não mereceria uma segunda chance, o mérito da confiança. É claro que essa atitude não corresponde a uma postura íntegra, abrangente e compreensiva em relação a todos os aspectos da existência. Esse pensamento é a base da pena de morte. Basta, então, assegurar que macacos ou humanos como Koba tenham sua liberdade restringida para que não possam mais agir em detrimento dos demais. Mas Cesar não tinha alternativa, pois a qualquer momento o ex-amigo poderia montar outra armadilha fatal para si, sua família ou sua tribo. Prendê-lo seria se comportar como os humanos que os aprisionavam em jaulas, e esse procedimento os macacos aparentemente rejeitavam. Cesar agiu bem, como líder sábio, bom avaliador dos prós e dos contras, a balança do sentimento.
Koba
     Um aspecto estranho no filme, assim como nas primeiras versões, é ver os seres humanos aprisionados pelos macacos. É uma inversão impressionante! Aí os humanos tomaram o lugar dos animais. Suponho que compartilho essa sensação de estranheza com muitos outros espectadores. Seria ela causada pelo costume de ver os animais presos? Ou de vê-los suscetíveis de maus tratos? Ou será que ver o nosso lado animal simbolizado no filme nos causa um certo desconforto em perceber como podemos ter nosso lado “racional”, ou quem sabe “humano”, submetido a fatores psíquicos mantidos fortemente “sob rédea”. Pode ser que cada um desses argumentos tenha seu papel nesse assombro.
     O segundo filme do Planeta dos Macacos consegue prender a atenção do começo ao fim. Desde o primeiro, nos acostumamos a ser conduzidos paulatinamente à conclusão. Tudo fica muito bem explicado e explícito. Não precisamos deduzir ou imaginar muita coisa, mas ele nos faz questionar o estabelecido, o instituído, assim como nossos hábitos científicos, ecológicos, familiares e sociais. Não conseguimos deixar de perguntar, mais uma vez: quem somos nós? E talvez indaguemos, com maior correção: “quem mais somos nós?”, deixando espaço extra para outras possibilidades, algumas apontadas pelo filme.

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